Translate

domingo, agosto 23, 2020

SUGESTÕES DE SITES QUE AJUDAM VOCÊ, PROFESSOR EM SALA DE AULA, E O ALUNO EM ATIVIDADES ONLINE😃


30 Sites que oferecem Atividades para Educação Infantil de Graça


Uma contribuição para os colegas professores, para este período de pandemia.

www.escolagames.com.br

https://conteudoaberto.ftd.com.br/

www.amplifica.me/simplifica/

www.aprendendosempre.org/

www.smartkids.com.br

www.vilasesamo.com.br

www.somatematica.com.br

www.soportugues.com.br

www.sohistoria.com.br

www.sogeografia.com.br

www.solinguainglesa.com.br

www.bebele.com.br (para pequeninos)

www.hvirtua.com (para pequeninos)

www.eduedu.com.br/ (aplicativo para alfabetização)

https://institutoitard.com.br/ 

http://atividadeparaeducacaoespecial.com/

https://rachacuca.com.br/

https://www.digipuzzle.net/

https://atividadeseducativas.com.br/

https://brincandocomarie.com.br/

https://novaescola.org.br/conteudo/19044/alfabetizacao-em-tempos-de-coronavirus-como-fazer

www.novaescola.org.br/guias/854/contos#

https://www.euleioparaumacrianca.com.br/

http://espacodeleitura.labedu.org.br/

http://labedu.org.br/todacriancapodeaprender/

www.escrevendoofuturo.org.br

www.portaltrilhas.org.br/inicio/

www.serdigital.com.br/gerenciador/clientes/ceel/arquivos/5.pdf

terça-feira, agosto 18, 2020

A história das constituições brasileiras e a evolução ao longo dos anos

Resumo: O presente trabalho tem por finalidade analisar a história da Constituição da República Federativa do Brasil do ano de 1824 até a o ano de 1988, abordando seus aspectos históricos e os pontos principais de cada Constituição. Ainda será demonstrado que em aproximadamente 500 anos de história houve a promulgação de 05 Constituições que previam garantias e deveres para a sociedade de cada época e, por fim, será demonstrado o grande avanço com a promulgação da Carta Magna de 1988, a qual atendeu os anseios da sociedade.

Palavra-chave: Constituição Federal; História; Direitos e Deveres.

Esse conteúdo ajudou você? Está precisando comprar um livro?  Clique AQUI e vá direto para Livraria do Âmbito Jurídico!

Abstract: The purpose of this study is to analyze the means and mechanisms for the protection of women, through the Maria da Penha Law, the International Convention on the Protection of Women and the UN Women – the United Nations Entity for Gender Equality and the Empowerment of Women. Still, it will be briefly touched upon the emergence in 1848 of the Seneca Falls Convention claimed equal property, salary, custody of the children, autonomy to enter into contracts and the ability to bring lawsuits to the female gender. Finally, a brief explanation about the Maria da Penha Law and its effects, after being sanctioned by the President of the Republic.

Key-word: Women's Human Rights; Discrimination by gender; Woman; Equality.

Sumário: 1. Introdução; 2. A Constituição Imperial de 1824; 3. A Constituição de 1891; 4 A Constituição de 1934; 5. A Carta Outorgada em 1937; 6. A Constituição de 1946; 7. A Constituição de 1967; 8. Constituição de 1988: a Constituição Cidadã; 10. Conclusão. Referências.

1 INTRODUÇÃO

O presente artigo tem afinalidadede trazer a baila à história das Constituições Brasileiras desde os primórdios até a Constituição Federal atual. O desenvolvimento de cada Constituição, primeiramente, deve ser observado para entender a forma que se apresenta a Carta Magna de 1988.

A análise aborda os momentos históricos em que cada Constituição foi elabora, bem como destaca suas principais características e, similarmente aponta desde o momento imperial, o momento ditatorial e democrático que, indubitavelmente, contribuíram para a criação das constituições.

Em quase 500 anos de histórias, foram criadas, mais de 05 (cinco) Constituições e isso se dá diante das grandes mudanças que ocorreram no decorrer dos séculos. Entre tais mudanças destacam-se as liberdades restritas, algumas limitações e autorizações para prática de determinados atos antes contestados. Nesta senda, os contextos sociais, políticos e econômicos vividos no Brasil desde a independência até os dias hodiernos, refletem nas cartas magnas. 

É certo que um Estado, onde seus cidadãos gozam de direitos e deveres, deve ter uma Constituição que, além de satisfazer os anseios de sua nação, seja bem constituída juridicamente. 

Destarte, visando explorar a composição do processo constitucional do Brasil, bem como relatar a forma de cada uma das Constituições, a começar pela Constituição Imperial de 1824 até a Constituição Federal de 1988, será usado o levantamento bibliográfico e documental, enriquecido com pesquisa em sites relacionados ao mesmo tema.

2 A CONSTITUIÇÃO IMPERIAL DE 1824

Em 1824, no dia 25 de março foi outorgado, por Dom Pedro I, a primeira Constituição do Brasil denominada Constituição Imperial.

Neste período, sofria a alta sociedade brasileira incisiva influência europeia, pois os filhos de famílias enriquecidas estudavam na Europa de onde vieram trazidas com a Revolução Francesa, ideologias liberais que exerceram grande ingerência sobre o Brasil.

Assim, fez-se necessário a criação de uma Constituição depois de proclamada a Independência do Brasil, objetivando validar o novo império, e oficializar um equilíbrio entre diversas classes sociais que disputavam o poder político.

A Monarquia era contra o absolutismo e, desde instalada a Assembleia Constituinte Dom Pedro I se declarou contra qualquer restrição política intolerável dizendo “com minha espada defenderia a Pátria, a Nação e a Constituição, se fosse digna do Brasil e de mim”. (PINHO, 2014; p. 192).

O Imperador, com apoio dos ricos comerciantes portugueses, do então chamado partido português, dissolveu a primeira Assembleia Constituinte brasileira e impôs no ano de 1824 seu próprio projeto que se tornou a Carta Magna.

A Constituição do Império foi a de maior durabilidade da história do Brasil, pois permaneceu vigorante por 65 anos, até a proclamação da República e mostrou imensa evolução quanto aos direitos fundamentais e demais garantias, mas também apresentou contrariedades entre o liberalismo e o absolutismo.

Nesta senda, Paulo Bonavides e Paes de Andrade destacam:

“Teve, a Constituição, contudo, um alcance incomparável, pela força de equilíbrio e compromisso que significou entre o elemento liberal, disposto a acelerar a caminhada para o futuro, e o elemento conservador, propenso a referendar o status quo e, se possível, tolher indefinidamente a mudança e o reformismo nas instituições. O primeiro era descendente da RevoluçãoFrancesa, o segundo da Santa Aliança e do absolutismo. […] Pelo conteúdo também, porque a Constituição mostrava com exemplar nitidez duas faces incontrastáveis: a do liberalismo, que fora completa no Projeto de Antônio Carlos, mas que mal sobrevivia com o texto outorgado, não fora a declaração de direitos e as funções atribuídas ao Legislativo, e a do absolutismo, claramente estampada na competência deferida ao Imperador, titular constitucional de poderes concentrados em solene violação dos princípios mais festejados pelos adeptos do liberalismo”. (1991, p. 95).

Notoriamente a Carta Magna de 1824 constitucionalizou o Poder Moderador, pois conferiu ao Imperador competência para proceder de forma quase que ilimitada, onde este poderia mandar e desmandar no império brasileiro, seguindo nesses moldes o absolutismo que predominava na Europa até o findado século XVIII.

Por outro prisma, o caráter liberal abarcou a constitucionalização de direitos fundamentais como a liberdade de expressão e religião e a inviolabilidade dos direitos civis e políticos entre outros, mostrando-se um enorme avanço para a época, afastando em uma linha tênue, a tradição de controle soberano do poder.

A Constituição Imperial é conhecida também pela intrínseca divisão de poderes, incluindo entre o poder legislativo, executivo e judiciário o Poder Moderador. Com o objetivo de por fim as controvérsias e desavenças, o Poder Moderador assegurou ao Monarca, que era o mandante supremo, sua autoridade sobre os demais poderes, visto que a Carta Magna centralizou na prática a autoridade máxima do executivo ao Imperador, que guardava o poder de adiar seções da Assembleia Geral ou então dissolver a Câmara dos Deputados. 

Cabia ao Monarca no exercício do Poder Moderador sancionar decretos e resoluções da Assembleia Geral; nomear um terço dos senadores; nomear e demitir de forma livre os Ministros de Estado; perdoar ou moderar as penas impostas ao réu entre outras atribuições.

Na Constituição Imperial predominavam algumas características, dentre elas estão a Monarquia como forma de governo; o catolicismo que era considerado religião oficial do Estado; a existência de quatro poderes (legislativo, executivo, judiciário e o moderador); o poder moderador era garantido somente ao Monarca e etc. (PINHO, 2014, p. 194).

Vale pontuar que a Carta Magna de 1824 foi outorgada e considera semi-rígida, diante da possibilidade de alteração em seu texto constitucional, era formal, escrita, analítica e dogmática.

3 A CONSTITUIÇÃO DE 1891

Findo o Império Brasileiro, por conseguinte o fim da monarquia e da escravidão, a Primeira República instaurada recebeu sólida influência norte-americana e nos termos do positivismo da filosofia francesa, estabeleceram-se com a Constituição de 1891 as características primordiais do Estado Brasileiro contemporâneo como o presidencialismo, separação entre Estado e religião e, com o fim do Poder Moderador, surgindo assim, a independência dos três poderes.

Foi tamanha a influência norte-americana que o Estado ficou conhecido como “Estados Unidos do Brasil”, diante do sucedido regime republicano vigorante nos Estados Unidos da América desde a independência. (PINHO, 2014. p. 195)

O Imperador, ao adotar um Estado unitário durante seu reinado em 1824, trouxe consigo insatisfação e o povo, logo, se mostrou revoltado com a Monarquia, dando origem mais tarde a Revolução Pernambucana de 1824 e a movimentos políticos.

Ademais, as forças militares que antes permanecia inerte quanto as decisões políticas, começa a agir de forma eficaz, dando origem, dessa forma, ao golpe militar aplicado em 15 de novembro de 1889, e por meio do Decreto nº, 1, originou a República Federativa, consequentemente com a família imperial sendo banida do território nacional (PINHO, 2014, p. 194), também por meio de um decreto.

Com a proclamação de uma nova forma de governo, diante da característica démodé da Carta Magna Imperial, necessário a elaboração de uma nova Constituição e, assim sendo, em junho 1980 foi submetido ao Congresso um projeto de Constituição e, em 1891 no dia 24 de fevereiro a primeira Carta Magna Republicana do Brasil foi promulgada.

Nos ensinamentos de Celso Bastos:

“Com a Constituição Federal de 1891, o Brasil implanta, de forma definitiva, tanto a Federação quanto a República. Por esta última, obviam-se as desigualdades oriundas da hereditariedade, as distinções jurídicas quanto ao status das pessoas, as autoridades tornam-se representativas do povo e investidas de mandato por prazo certo”. (2002, p. 173)

Nesta linha Paulo Bonavides e Paes de Andrade destacam:

“O texto te 1891, com seus 91 artigos e 8 disposições transitórias veio a ser, em termos jurídicos, o grande monumento de nossa erudição liberal. Em matéria de teor basicamente constitucional, consagrava ela a separação de poderes de conformidade com a proposta de Montesquieu – fórmula peculiar, aliás, a todas as Constituições do liberalismo.

Confirmava também o sistema federativo já decretado pela ditadura de 15 de novembro de 1889, ao mesmo passo que introduzia tacitamente a forma presencial de governo”. (1991, p. 250-251)

Possível verificar que a Carta Constitucional de 1891 implementou uma tripartição de poderes, como apregoou Montesquieu, outorgando, com independência, a função respectivaa cada Poder.

A partir de então passa a militar o voto direto de todos os cidadãos alfabetizados do sexo masculino e maiores de 21 anos, para eleger Presidente da República, Vice-Presidente, Senadores e Deputados, findando a restrição aos cidadãos pouco afortunados para se candidatar trazida pela Carta Imperial. Cessa ainda a vitaliciedade dos senadores, com a redução do mandato para nove anos.

Em consonância com o regime republicano, trouxe a Lei Maior de 1891 uma grande diferença da Constituição Imperial, pois previa em seu texto crime de responsabilidade do Presidente da República, o que difere do Poder Moderador amparado pela Carta Magna de 1824, onde o Imperador era reputado com imunidade total, inviolável, ou seja, não era passível de responsabilidade alguma.  

Oportuno assinalar que foi extinto ainda os privilégios de nascimento, evitando, dessa forma, reconhecimento de títulos de nobreza.

4 A CONSTITUIÇÃO DE 1934

O golpe militar sofrido em 15 de novembro de 1889 deu origem ao “coronelismo”, visto que o coronel tornou-se a autoridade local e, por sua vez, sustentava e protegia sua população, contudo, exigia em troca, dos serviços prestados, fidelidade e obediência.

Com o coronelismo surge o então “voto de cabresto”, pois devido ao voto ser aberto, era possível saber quem não foi fiel ao coronel ou ao seu candidato na hora do pleito. Assim, com a democracia ilustrativa estabelecida pela Constituição de 1891, pois os coronéis elegiam os Governadores, Deputados e Senadores, e os Governadores escolhiam o Presidente da República, fomentou na população o anseio de maior participação política, e o desejo de honestidade nas eleições. 

José Afonso da Silva aduz que:

“O poder dos governadores, por sua vez, sustenta-se no coronelismo, fenômeno em que se transmudaram a fragmentação e a disseminação do poder durante a colônia contido no Império pelo Poder Moderador. […] A relação de forças dos coronéis elegia os governadores, os deputados e senadores. Os governadores impunham o Presidente da República. Nesse jogo, os deputados e senadores dependiam da liderança dos governadores. Tudo isso forma uma constituição material em desconsonância com o esquema normativo da Constituição então vigente e tão bem estruturada formalmente.” (2008, p. 80)

Desta forma, nasce a Revolução de 1930 trazendo em seu âmago o propósito de modificar o regime que se instituiu com a Carta Magna de 1981, e voltada para a democracia social, acabaria com o coronelismo e com a política dos Governadores.

Com a vitória da Revolução, Getúlio Vargas, empossado pela Junta Governista em 3 de novembro, expediu um decreto definido como uma lei constitucional provisória. O decreto dava ao Governo Provisório funções e atribuições dos Poderes Legislativo e Executivo.

Getúlio, nesse contexto, por meio de outro decreto, marca para o dia 03 de maio de 1932 a eleição para eleger os membros da Assembleia Nacional Constituinte, que deu início a elaboração da Lei Maior de 1934.

O texto constitucional no dia 09 de julho foi levado à aprovação final da Assembleia Constituinte e promulgada na sessão do dia 16 de julho de 1934, com forte inspiração na Constituição Alemã de Weimar de 1919 e na Constituição Espanhola de 1931.

Neste ínterim, criou-se uma Constituição social com caráter democrático trazendo alterações significativas como: princípios básicos da legislação trabalhista; estabeleceu normas reguladoras da ordem econômica e social, educação e cultura, da família e da segurança nacional. Instituiu ainda a Justiça Eleitoral e Militar como órgãos do Poder Judiciário, tornou o voto secreto e deu às mulheres o direito de sufrágio.

Outro avanço de suma importância foi à educação ser proclamada como direito social, bem como o trabalho. Quanto aos direitos e garantias individuais se destaca a inserção do mandado de segurança, visando assegurar ao indivíduo proteção ao seu direito incontestável que fosse violado ou ameaçado por ato de qualquer autoridade.  

Embora tenha apresentado avanços importantes, a Constituição de 1934 não vigorou por muito tempo. Com o golpe de 1937 foi inserido o Estado Novo por meio de uma nova Constituição outorgada.

5 A CARTA OUTORGADA EM 1937

Pouco mais de três anos depois de promulgada a Constituição de 1934, foi imposta por Getúlio Vargas a Constituição de 1937, criando o denominado Estado Novo, com forte influição do modelo fascista de organização política. (PINHO, 2014, p. 198)

A Carta Magna de 1937 não foi redigida pela Assembleia Constituinte, ou seja, não passou por discussão e apreciação da casa, e sim elaborada por Francisco Campos, que era Ministro da Justiça do governo de Vargas. O novo texto formulado para dar esteio ao regime ditatorial estabelecido por Getúlio trazia em seu bojo o fascismo polonês, além da influência do regime italiano liderado por Mussolini.

A década de 30 traz, em seu contexto, uma tormenta ideológica e política escoltada de abalos na ordem institucional do país. Instalava-se, na realidade, uma ditadura onde o Presidente legislava por meio de decretos.

Com a crise político-ideológica que se instalava no Brasil, onde o extremismo não era, por óbvio, condizente com o liberalismo apregoado na Lei Maior de 1934, era o momento oportuno para que Getúlio se aproveitasse da situação e realizasse um golpe de Estado, outorgasse a nova Constituição de 1937, com viés completamente fascista, e concedesse vastos poderes ao Presidente da República, o que foi feito em 10 de novembro de 1937, quando foi anunciado a Nação o golpe de Estado.

A Carta de 1937, apelidada de “polaca” diante da paridade com a Lei Maior polonesa de 1921, não foi de fato vigente, pois Getúlio tal como um ditador, governou por seus próprios termos.

Pontua Antonio Fernando Pires que:

“A Constituição de 1937, não é preciso dizer, igualmente deixou de ser observada por Getúlio Vargas. Foi uma Constituição-fantoche. O Senado foi substituído por um Conselho Federal, cujos membros eram indicados pela Presidência da República. Embora mantida a Câmara dos Deputados, Getúlio Vargas tinha o poder constitucional de dissolvê-la, além de indicar os membros do Conselho Federal. Não se teve, nesta Constituição, no Preâmbulo, a evocação de Deus.” (2016, p. 51)

Como bem sinalou Pires, em consonância com o já dito anteriormente, a Constituição de 1937 seguiu apenas formalmente, pois não houve aplicação concreta de seus artigos durante a Presidência de Getúlio.

Vale lembrar que, a separação dos poderes prevista na Constituição de 1934, não tinha ímpeto, ou seja, não se concretizava. Já não existia, mas o Senado e Poder Legislativo a qualquer instante poderia ser colocado em inatividade pelo Presidente.

Dentre as principais características da Carta Política de 1937 estão à centralização do Poder Executivo e Legislativo na pessoa do Presidente, a separação era apenas formal; o trabalhador não poderia fazer greve; os direitos e garantias individuais foram limitados; prenunciava o plebiscito para outorga-la, contudo, jamais aconteceu.

Diante dos abalos políticos sofridos com o golpe de Estado arquitetado por Getúlio Vargas, as eleições de 1938 não se concretizaram e Getúlio permaneceu no poder. Foi o Presidente brasileiro que perdurou no poder por mais tempo, atingindo um total de 18 anos de governo.  

6 A CONSTITUIÇÃO DE 1946

Getúlio Vargas ainda no poder, após a segunda Guerra Mundial em 1945, com o retorno das tropas, convocou as eleições para Presidência, momento em que vence o pleito Eurico Gaspar Dutra.

A mesa da Assembleia convocada por Eurico, novo Presidente da República, foi eleita em dezembro de 1945, iniciando seus trabalhos no ano seguinte, e no dia 18 de setembro de 1946 foi promulgada a Carta Magna. 

A nova Carta Política tinha como objetivo extinguir os atos repressivos criados durante o Estado Novo. Para o processo de discussão e criação da Carta participaram nove legendas partidárias, demonstrando assim, sua condição democrática.

Uma das principais mudanças trazidas nessa Carta é a restauração dos Três Poderes, consoante ensinamento de Antonio Fernando Pires:

“A Carta de 1946, de 18 de setembro de 1946, é considerada por muitos autores como a melhor que tivemos. Saboreava ares de democracia e liberdade pós-guerra e restituiu inúmeros avanços que tivemos na Constituição de 1934. Uma das principais mudanças foi a restauração dos Três Poderes, independentes e harmônicos entre si. O Poder Judiciário recuperou seu prestígio ao declarar a inconstitucionalidade de leis e atos normativos e fixou as três conhecidas garantias da magistratura: vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade de vencimentos”.(2016, p. 53)

Essa tripartição dos poderes buscava restabelecer e delimitar os poderes de cada um deles. Essa mudança se deu ematenção aos anos em que Getúlio Vargas estendeu as prerrogativas do Pode Executivo, gerando, portanto, controle de praticamente todas as ações do Estado. A reeleição para cargo do Executivo foi censurada, e o mandato duraria 5 anos.

O Senado tem suas funções reconstituídas, e entre elas a de julgar o Presidente da República e demais autoridades por crime de responsabilidade, o que se faz oportuno ressaltar, visto que o país livrava-se de um regime ditatorial.

Assim instituía o artigo 62 da Constituição de 1946 in verbis:

“Art. 62 – Compete privativamente ao Senado Federal:

I – julgar o Presidente da República nos crimes de responsabilidade e os Ministros de Estado nos crimes da mesma natureza conexos com os daquele;

II – processar e julgar os Ministros do Supremo Tribunal Federal e o Procurador-Geral da República, nos crimes de responsabilidade.” (Brasil, 1946)

Visando promover uma proteção maior dos direitos individuais a Carta Magna consagrou o mandado de segurança e o direito de greve:

“Art. 141 – A Constituição assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, a segurança individual e à propriedade, nos termos seguintes:

 24 – Para proteger direito líquido e certo não amparado por habeas corpus, conceder-se-á mandado de segurança, seja qual for a autoridade responsável pela ilegalidade ou abuso de poder.

Art. 158 – É reconhecido o direito de greve, cujo exercício a lei regulará.” (Brasil, 1946)

Quanto ao processo eleitoral, foi revogado as bancadas criadas por Vargas e autorizado o voto feminino a todas as mulheres não apenas as que possuíam cargo público.

Destarte, a Constituição de 1946 tenha se mostrado de suma relevância, foi marcada também por forte crise política, a começar com o suicídio de Getúlio, depois de padecer as pressões esquerdistas e militares.

Sua sucessão foi assinalada por conturbações, e chega ao poder Juscelino Kubitschek. Logo depois Jânio Quadros renunciando ao mandato sete meses depois, e posteriormente João Goulart.

A Carta Magna “que perdurou até 1967, sobreviveu ao golpe militar de 1964, embora desfigurada por sucessivos atos institucionais, que concentravam poderes nas mãos do Presidente da República”. (PINHO, 2014, p. 200).

7 A CONSTITUIÇÃO DE 1967

Em 1964 o país sofria um golpe Militar que derrubou o então Presidente da República em exercício João Goulart em 31 de março. A Constituição não foi inteiramente revoga de imediato, no entanto, sofreu diversas alterações, deixando sua linha democrática para chegar à ditadura militar. 

Os militares baixaram de imediato o Ato Institucional n.º 1, que previa a instalação de uma Assembleia Constituinte popular. E a partir de entãodurante o tempo vigente da Constituição de 1967, seriam usados Atos Institucionais como forma de Governo. Estes atos erambaixados pelos militares na condição de Presidentes da República, e tinham caráter antidemocrático e ditatorial. (PIRES, 2016, p.54).

Os militares tão logo tomaram o poder, e a Constituição de 1964 começou a ser invalidada aos poucos por meio dos Atos Institucionais, ou seja, decretos autoritários que davam ao Presidente da República, mesmo com uma Constituição Vigente, poderes absolutos. 

O AI-2 (Ato Institucional n.º 2) decretou o fim de partidos políticos, extinguiu as garantias da magistratura e possibilitou a cassação de direitos políticos.

O AI-3 determinou as eleições indiretas para Governadores. Já o AI-4 foi editado no dia 07 de dezembro de 1966 convocando o Congresso para se reunir em uma sessão extraordinária, com o objetivo de discutir, votar e promulgar o projeto de Constituição apresentado pelo Presidente General Castelo Branco. A promulgação da Constituição militar aconteceu tão logo em 24 de janeiro de 1967.

Os abusos de poder cometidos pelos Presidentes militares,por meio dos Atos Institucionais, geraram insatisfações e ocasionaram alguns movimentos estudantis que encheram as ruas do país.

Com todo esse clamor nas ruas, devido à insatisfação da população, na tentativa de acabar com esses movimentos, surge o AI-5, totalmente autoritário, conferindo ao Presidente o poder de fechar as casas do Legislativo, de suspender os direitos políticos e cassar os mandatos de parlamentares que se manifestassem contra o regime militar imposto, suspender a garantia do habeas corpus em crimes políticos, bem como suspender as garantias de membros do Judiciário.

O texto Constitucional não era colocado em prática, o que se operava era arbitrário, e no dia 17 de outubro de 1969, a Junta Militar provisória, outorgou à Emenda Constitucional nº 1, com alterações que apenas tornou-a mais autoritária. Essa Emenda desperta divergências, visto que grande parte da doutrina a considera como uma nova Constituição.

Com as eleições para Governador em 1982, era possível perceber que não havia uma boa popularidade do governo, diante da vitória da principal oposição do governo ditatorial. Tal fato fomentou o povo a reivindicar eleições diretas para Presidente da República, que aconteceu pouco tempo depois. Essas manifestações, já no ano de 1984, ficaram conhecidas como “diretas já”, mas que na verdade foram indiretas, e levaram ao poder Tancredo Neves do Partido da Mobilização Democrática do Brasil.

Após tantos anos sob um regime de ditadura militar, o povo se viu esperançoso com a eleição de Tancredo Neves, pois esperavam uma nova democratização, mas que dessa vez fosse favorável a população e atendesse as suas necessidades. No entanto, o Presidente então eleito não chegou a tomar posse, pois faleceu logo após, e seu vice Jose Sarney é quem assume a Presidência.

Assim, logo após assumir a Presidência foi elabora pela Assembleia Constituinte o texto de uma nova Constituição, que veio a ser promulgada em 05 de outubro de 1988. 

8 CONSTITUIÇÃO DE 1988: A CONSTITUIÇÃO CIDADÃ

O Presidente eleito em 1984, Tancredo Neves se comprometeu, em campanha eleitoral, convocar uma Assembléia Constituinte para elaborar a nova Constituição do país. Contudo, em virtude de seu falecimento, suas promessas foram cumpridas por seu Vice-Presidente José Sarney.

Nas discussões da Constituinte diversos temas seriam abordados e discutidos, inclusive a durabilidade do mandato de Sarney, além da reforma agrária, o papel dos militares no país, duração da jornada de trabalho etc.

A Constituição, após um extenso procedimento de elaboração, discussão e votação do texto, e depois de 20 anos de ditadura, foi promulgada no dia 05 de outubro de 1988, conhecida como “Constituição Cidadã”, defensora dos valores democráticos.

Nesta senda Rodrigo Rebello Pinho afirma:

“Essa Constituição é fruto de um poder constituinte originário, que teve como origem em um processo de transição pacífica do regime militar para o regime democrático. A maior evidencia de que a atual Constituição é fruto de um poder originário, muito embora tenha sido convocada por uma emenda à Constituição, foi a realização do plebiscito em que o povo brasileiro pode escolher a forma de governo a ser adotada pelo Estado brasileiro: Republica ou Monarquia. A República era uma das clausulas pétreas de todas as Constituições republicanas. Só se foi possível a realização da consulta popular em razão de a Assembleia Nacional Constituinte possuir poderes próprios de um constituinte originário, não estando subordinado a limitações anteriormente existentes”. (2014, p. 204)

Traz em suas linhas aspectos fundamentais que antes foram comprimidos pela ditadura militar, ademais, o regime ditatorial foi um retrocesso para tudo que foi conquistado ao longo de tantas Constituições.  

Consagrou a Carta Magna direitos individuais como o princípio da dignidade humana e o crime de racismo que foi retratado como inafiançável. (Arts. 1º, III, 5º XLII). Há que se dizer também sobre os direitos sociais como os direitos dos trabalhadores que recebeu capítulo próprio (Capítulo II), foi de suma importância.

No texto Constitucional, in verbis, temos:

“Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado democrático de direito e tem como fundamentos:

III –a dignidade da pessoa humana;

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo- -se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (EC no 45/2004)

XLII – a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei”; (BRASIL, 1988)

A Carta Política, concluída em um ano e oito meses,viabilizou ainda ascensãonas áreas de saúde (com a implementação do Sistema Único de Saúde), direito da criança e do adolescente e novo Código Civil.

Antonio Fernandes Pires aduz que:

“A Constituição de 1988 é conhecida como a “Constituição Cidadã”, apelido a ela concedido por um de seus mais ferrenhos laboriosos, Ulysses Guimarães.

Sem dúvida alguma, (foi) é a Constituição com mais valores em forma de princípios que já tivemos, uma das que mais instrumentos de proteção dos direitos fundamentais tivemos, a mais democrática de todas, com a experiência do voto em sua plenitude e consolidação e pleno desenvolvimento de todas as Instituições e Poderes”. (2016, p. 57)

Foi considerada a Constituição de 1988, dentre todas já existentes, a mais completa. Recebeu críticas quanto sua dimensão, visto que possui diversos artigos. Passou por mais de 80 emendas e 6 emendas de revisão. E nessa extensa dimensão foi conquistado o maior direito do cidadão que vive em um Estado Democrático de Direito, determinando a eleição para os cargos de Presidente da República, Governador, Prefeito, Deputado, Senador e Vereador. Outrossim, trouxe de volta, por meio da Emenda Constitucional nº 16, a possibilidade de reeleição do Presidente da República, Governador e Prefeito Municipal.

Com a CF/88 o cidadão tem garantido seu direito de ter acesso aos dados que existem a seu respeito em órgãos governamentais, por meio do habeas data. A concessão de emissoras de televisão e rádio ainda é poder do Executivo, sob a avaliação do Congresso Nacional.

Oportuno salientar sobre a existência de cláusulas pétreas na Carta Magna, onde “o legislador constituinte originário criou uma super-rigidez num locus constitucional,qual seja, o art. 60, §4.º, o qual trata de matérias referentes que não podem ser abolidas por Emendas” (PIRES, 2016, p. 60). Portanto, não podem ser modificadas, e nem ao menos serão discutidas em proposta de modificação constitucional.

Os Remédios Constitucionais também são frutos da Constituição de 1988, e são classificados como instrumentos jurídicos à disposição dos cidadãos, visando provocar a intervenção das autoridades competentes, para que se tornar efetivo o exercício dos direitos constitucionais. São eles: Habeas corpus, habeas data, mandado de segurança, mandado de segurança coletivo, mandado de injunção, ação popular e direito de petição.

A Constituição de 1988 foi promulgada, pois contou com a participação da população, é formal e escrita, dogmática – criada por um órgão constituinte, é analítica e rígida, ou seja, só pode ser alterada por meio de emendas constitucionais.

Nota-se que a Constituição trouxe, dentre outras, muitas inovações buscando atender aos anseios de um povo totalmente insatisfeito com a ditadura militar que se instaurou anteriormente, visto que foram suprimidos direitos e garantias conquistadas duramente por longos anos. Com certeza é o instituto normativo mais importante do nosso ordenamento jurídico, e representa a Constituição Cidadã um enorme avanço para aquisição dos objetivos sociais do Estado democrático de direito.

10 CONCLUSÃO

Diversas foram as Constituições promulgadas e outorgadas ao longo de vários anos, em uma linha que começa no momento Imperial até a moderna Constituição Cidadã de 1988. Cada uma com suas peculiaridades, buscando atender os anseios da população, ou os próprios anseios dos Governantes.

A Constituição deve trazer em seu âmago interesses intrínsecos ao poder, mas que traga juntamente com esse poder princípios de ordem social, política e econômica, baseados em direitos fundamentais inerentes ao povo, e as necessidades que retratam o período que abrange a criação de seu texto, buscando além de tudo, sanar as injustiças e retrocessos cometidos anteriormente, de maneira que se forme uma Nação sem desigualdades.

É possível perceber que muitas foram às influências sofridas nas Constituições, como o liberalismo que incidiu na Constituição Imperial e os movimentos ideias positivistas na Carta Política de 1891.Nas Constituições de 1937 e 1967, o fascismo, a revogação de direitos individuais, a ditadura militar, causando insatisfações que levaram o povo a se manifestarem contra o Governo. Já as Constituições de 1934, 1946 e 1988 apresentam características opostas, marcadas pela democracia, com direitos de todas gerações. Bem se vê pela atual Constituição que tem estampada a democratização do Brasil, prevendo direitos e garantis individuais, sociais e coletivos entre outros.

A Constituição deve ter como premissa a manifestação de vontade do povo, e principalmente buscar a igualde social, agraciar a todos com direitos e garantias fundamentais, bem como a mantença dos princípios que norteiam as Leis de uma Nação.

 

Referências
BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de direito constitucional. São Paulo: Celso Bastos Editor, 2002.
BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 15 ed. São Paulo: Malheiros. 2007.
BONAVIDES, Paulo; ANDRADE, Paes de. História Constitucional do Brasil. 3 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1991.
BRASIL. Constituição (1946). Constituição dos Estados Unidos do Brasil. Rio de Janeiro, 18 de setembro de 1946. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao46.htm<. Acesso em: 20 de ago. de 2017.
BRASIL. Constituição (1988). Constituição Federal: promulgada em 05 de outubro de 1988/ed. [organizador: Nylson Paim de Abreu Filho] – Porto Alegre: Verno Jurídico, 2005.
Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil. Constituição de 1891.  Rio de Janeiro. Disponível em: <http://cpdoc.fgv.br/producao/dossies/AEraVargas1/anos20/CrisePolitica/Constituicao1891>. Acesso: 19 de ago. de 2017.
PINHO, Rodrigo Rebello. Col. Sinopses jurídicas 18 – Da organização do Estado, dos poderes e histórico das constituições, 15ª edição. Saraiva, 10/2014. Vital Source Bookshelf Online.
PIRES, Antonio Fernando. Manual de Direito Constitucional, 2ª edição. Método, 04/2016. Vital Source Bookshelf Online.
SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 30ª edição, revista e atualizada (até a Emenda Constitucional n. 56, de 20.12.2007). São Paulo: Malheiros, 2008.

Informações Sobre o Autor

Paulo Henrique de Campos Lopes Ferreira

Mestrando em Educação UDE – Universidad de La Empresa. Pós-Graduando em Neuroaprendizagem FSB – Faculdade São Braz. Especialista em Práticas Trabalhistas Facnopar – Faculdade do Norte Novo de Apucarana. Bacharel em Direito Facnopar – Faculdade do Norte Novo de Apucarana. Advogado OAB-PR. Professor Universitário Facnopar – Faculdade do Norte Novo de Apucarana. Secretário da Comissão da Advocacia Pública OAB/PR – Subseção de Apucarana – PR. Professor na Instituição de Ensino Superior Facnopar

A percepção da educação desde a perspectiva sociológica - Parte 4

 File:T. Parsons.jpg - Wikimedia Commons

A sociologia da educação de T. Parsons

65A obra que resume melhor a contribuição específica de Parsons para a sociologia da educação é The school class as a social system, publicada em 1959. Nesta obra, a escola é percebida como um subsistema social essencial, como agência de socialização e de diferenciação social. Além disso, está focalizada na sociologia da sala de aula (quando estuda a escola primária) e do centro escolar (no caso da escola do ensino secundário). Sua perspectiva ideológica é apenas relativamente parecida com a de Durkheim, de cujo objectivismo prescinde para adoptar uma orientação psicossociológica weberiana de corte reducionista. Mas, reproduz a visão durkheimiana da escola como «microcosmos social» especializado na homogeneização moral e na diferenciação pré-profissional dos cidadãos:

«O sistema escolar é um microcosmo do mundo laboral adulto, e a experiência nele constitui um campo muito importante de actuação dos mecanismos de socialização da segunda fase [a primeira é a família], a especificação das orientações do papel» (Parsons 1976, apud MIR 1990: 351).

66É na escola que a criança vai, gradualmente, construindo a sua própria identidade, e é capaz de fazê-lo porque «gasta várias horas diárias fora de casa submetida a uma disciplina e a um sistema de recompensas essencialmente independente do administrado pelos pais» (PARSONS 1985: 53).

67Nesta perspectiva, a escola primária representa a transição entre a família e a escola secundária, e, nesta fase, o mais importante é a ênfase na aprendizagem da motivação da realização e sua avaliação diferencial, pública e objectiva. Pois, no ensino secundário aumenta a internalização neutral, sem emoção e puramente abstracta da cultura e dos modelos mais universais do ser humano.

68A socialização na sala de aula — e mais tarde no espaço escolar — exige a aquisição de habilidades específicas para desempenhar os papéis de adulto e a aptidão adequada para desempenhá-los de forma responsável; quer dizer, para comportar-se da maneira que os outros esperam que se desempenhe cada papel específico. Mas, além disso, o aluno deve também identificar-se com os valores sociais dominantes e orientar-se para o exercício futuro de uma função ou um papel social mais ou menos determinado. Portanto, a socialização escolar tem duas dimensões fundamentais: instrumental e pré-profissional. A primeira de matriz moral, e a segunda de fundo ideológico.

69A dimensão moral e ideológica está relacionada com a função homogeneizadora do sistema de ensino. A escola distribui diferenciadamente as recompensas em função do rendimento académico individual. Neste sentido, o sistema de ensino hierarquiza o «nível das aspirações», que constitui uma espécie de ponte institucional que tem uma linha de bifurcação fundamental no final da escola superior: o ingresso ou a exclusão do ensino superior. Existe, ainda, «outra linha de demarcação entre os que chegam a um nível educacionalfora do ensino superior, e aqueles para quem a adaptação às expectativas educacionais é difícil em qualquer nível» (PARSONS 1985: 60).

70O funcionamento da escola como mecanismo diferenciador começa com a igualdade formal de todas as crianças antes da competição no desempenho das tarefas escolares, a avaliação periódica do cumprimento de cada aluno, que não é puramente neutra, apoiada em critérios intelectuais e morais, às vezes, mais importantes que os propriamente académicos. A identificação emocional (ou não) e mental com o professor e com a visão da cultura e da moral que ele representa é mais decisiva para o êxito escolar do que atingir ou não um nível de instrução.

71Parsons, à semelhança de Mannheim, não ignora a existência de um curriculum oculto e suas implicações. É atento à problemática da inconsistência de status das crianças procedentes de estratos sociais baixos e com alto rendimento escolar, ou à relação existente entre o tipo de pedagogia e de organização escolar formal dos diversos centros, por um lado, e a forma de socialização familiar e o status socioeconómico dos alunos, por outro. Refere, por exemplo, que os alunos dos centros mais «democráticos» e pedagogicamente mais inovadores normalmente provêm de camadas sociais relativamente acomodadas e com uma cultura académica acima da média.

72Do ponto de vista formal, o núcleo da sociologia da educação parsoniana circunscreve-se na visão da escola como canal institucional para a igualdade de oportunidades e o sucesso social dos mais aptos, na medida em que a instituição escolar — com o apoio da família — inculca a todos os cidadãos a concepção da cultura e a moral universalizadoras imprescindíveis para o funcionamento da sociedade, legitimando, concomitantemente, a divisão social do trabalho e as desigualdades sociais em geral, a ponto de conseguir, muitas vezes, o consentimento íntimo dos fracassados escolares. Assim,

73«A avaliação da consecução e o facto de que esta é dividida entre a família e a escola não apenas fornecem os valores necessários para a internalização pelo indivíduo, mas também desempenham um papel essencial de integração para o sistema. É necessário que as oportunidades sejam reais e que se possa contar com o professor para respeitá-las, sendo este "justo" para premiar alguém que se possa mostrar capaz. É essencial observar que a distribuição das faculdades, embora estejam ligadas ao status familiar, não corresponde claramente com esta condição» (PARSONS 1985: 58-59).

74Algumas críticas dirigidas a Parsons têm a ver com o facto de ter negligenciado o subjectivismo sociológico de Durkheim e empobrecido significativamente a orientação psicossociológica weberiana da lógica objectiva da dominação social. Como consequência lógica, Parsons prescinde da estruturação dual da cultura, da educação, da moral e da psicologia humana, e, com sua interpretação normativista idealista, esquece a análise rigorosa da base material da cultura e da educação. Parte de pressupostos muito discutíveis: a neutralidade moral do sistema escolar e seu lugar central como mecanismo de reprodução da cultura e da desigualdade social em conformidade com uma lógica estritamente meritocrática. O primeiro foi amplamente questionado por todos os clássicos e os principais neoclássicos da sociologia da educação. E, quanto ao segundo, é certo que Durkheim ou Mannheim o admitem, mas como projecto político e ideológico a promover de forma eficiente, e nunca como realidade histórica.

Conclusão

75Desde a perspectiva clássica e neoclássica da sociologia da educação, considera-se a educação como um processo de transmissão formal da cultura e, como tal, só é possível dentro de um horizonte e ambiente cultural apropriados com os seus elementos de preservação, disseminação e inovação. Nas sociedades mais desenvolvidas, este processo está estruturado de modo a satisfazer as necessidades sociais de educação moral, cultura, de ensino especializado ligado a exigências de economia, de trabalhadores habilitados, cientistas e pessoal profissionalizado, e de alargamento do conhecimento por investigação, e outras.

76Em termos muito latos e com muitas variações entre países e regiões, a classe social e os seus correlativos ainda têm um efeito sistemático na educabilidade e na selecção educacional; por exemplo, ainda hoje, as oportunidades de obter educação superior são maiores e melhores para uma criança da classe média do que para uma criança da classe trabalhadora. Ainda hoje, na segunda década do século XXI, os determinantes sociais do sucesso escolar são imensos, não obstante a tendência crescente para uma igualdade formal de oportunidades nos modernos sistemas educacionais.

77Por isso, perceber o fenómeno educativo através da visão clássica e neoclássica permite-nos não apenas escrutinar a realidade educacional, mas também compreender melhor as interfaces do sistema e do processo de ensino. Com efeito, entre eles — clássicos e neoclássicos da sociologia da educação —, assiste-se a uma grande convergência de ideias, que podem se considerar complementares na prática educativa, na medida em que expressam de maneira geral a análise das instituições e organizações da educação. Porém, essa análise só cobra sentido quando conectada às relações funcionais entre a educação e outras grandes ordens institucionais da sociedade, tais como a economia, a religião, a política e a família.

78Por isso, em plena sociedade da informação e comunicação, à escola desta sociedade não apenas cabe a função de definir objectivos, a distribuição de papéis, as disciplinas, o conteúdo e o método de aprendizagem, mas também lhe é exigido rever suas relações com as outras modalidades de educação não formal (informal e profissional), para articular-se e integrar-se a elas e liderar o processo de socialização do conhecimento, com o propósito de formar cidadãos mais preparados e qualificados para corresponder às novas demandas sociais.

Topo da página

Bibliografia

CAMPENHOUDT L. V., 2012 (2.ª edição), Introdução à análise dos fenómenos sociaisTradução de Eduardo de Freitas e revisão de Manuel Joaquim Vieira. Lisboa, Gradiva [«Trajectos»].

DURKHEIM E.,1975, Educación y sociología. Prefácio de Maurice Debesse; epílogo de Joan Volker e tradução de Janine Muls de Liarás. Barcelona, Península [«Homo sociologicus»].

DURKHEIM E.,1982, Historia de la educación y de las doctrinas pedagógicas: La evolución pedagógica en Francia. Apresentação de Félix Ortega; tradução de Maria Luisa Delgado e Félix Ortega. Madrid, Las Ediciones de la Piqueta [«Genealogía del poder»].

MANNHEIM K., 1961 [1944], Diagnóstico de nuestro tiempo. Tradução de José Medina Echavarría. México, Fondo de Cultura Económica [«Colección Popular»].

MANNHEIM K., 1974 [1963], Libertad, poder y planificación democrática. Tradução de Florentino M. Torner. México, Fondo de Cultura Económica.

MARX K., 1968, Crítica al programa de Gotha. Versión castellana revisada y ajustada a la edición soviética de 1953, editada pelo Instituto de Marxismo y Leninismo. Madrid, Ricardo Aguilera.

MARX K., 1975-1981, El capital. Critica de la Economia Política. Tradución y notas de Pedro Scaron. volumes I, II e III. Madrid, Siglo XXI [«Biblioteca del pensamiento socialista»].

MARX K. & ENGELS F., 1970, La ideología alemanaCrítica de la novíssima filosofia alemana en las personas de sus representantes Feuerbach, B. Bauer y Stirner y del socialismo alemán en las de sus diferentes profetas. Tradução de Wenceslao Roces. México, Ediciones Grijalbo S.A.

MARX K. & ENGELS F.,1978, Textos sobre educación y enseñanza. Madrid, Comunicación.

MIR R. F., 1990, Sociología de la educación: Guía didáctico y textos fundamentales. Madrid, Secretaria General del Consejo de Universidades.

MONTOYA B. L. C., 1986, «Limitaciones del análisis de Marx sobre la "legislación fabril" en El capital: discusión a propósito de su valoración sobre las "cláusulas educacionales"», Revista de Educación, n.º 281, pp. 213-224.

PARSONS T., 1976, El sistema social. Tradução de J. Jiménez Blanco e J. Cazorla Pérez. Madrid, Biblioteca de la Revista de Occidente.

PARSONS T., 1985 (3.ª edição), «La clase como sistema social: Algunas de sus funciones en la sociedad americana» in Alain Grass (coord.), Sociología de la educación: Textos fundamentalesMadrid, Editorial, Narcea, pp. 2-7.

Topo da página

Para citar este artigo

Referência do documento impresso

António Inácio Rocha Santana« A percepção da educação desde a perspectiva sociológica »Mulemba, 6 (12) | 2016, 91-120.

Referência eletrónica

António Inácio Rocha Santana« A percepção da educação desde a perspectiva sociológica »Mulemba [Online], 6 (12) | 2016, posto online no dia 30 setembro 2018, consultado o 18 agosto 2020URL: http://journals.openedition.org/mulemba/853; DOI: https://doi.org/10.4000/mulemba.853

Topo da página

Autor

António Inácio Rocha Santana

Sociólogo. Director-Geral da Escola Superior Pedagógica do Kwanza Norte e docente do Departamento de Sociologia da Faculdade de Ciências Sociais (FCS) da Universidade Agostinho Neto (UAN).

Sociólogo, exerce desde 2010, em comissão de serviço, a função de Director-Geral da Escola Superior Pedagógica do Cuanza Norte. É docente do Departamento de Sociologia (DS) da Faculdade de Ciências Sociais (FCS) da Universidade Agostinho Neto (UAN). Doutorado em Sociologia (2005) pelo Instituto de Sociología y Estudios Campesinos de la Universidad de Córdoba, Reino da Espanha e Doutorado em Ciências da Educação (2015) pela School of Social and Human Studies of the Atlantic International University, Estados Unidos da América (EUA). Tem participado com comunicação em alguns eventos nacionais e estrangeiros e dentre os quais se regista: «La comunicación docente: los comentarios de los estudiantes acerca de la actitud de los docentes en el aula», comunicação apresentada ao Congresso Pedagogía 2015, Palácio de Convenciones de La Habana, de 26 a 30 de Janeiro de 2015; «As manifestações do preconceito de cor em Angola», comunicação apresentada na 2.ª Conferência Internacional do CONCLADIN — Centro de Estudos das Culturas e Línguas Africanas e da Diáspora Negra, São Paulo, Universidade Estadual de São Paulo, Araraquara, Brasil, 18 a 21 de Maio de 2009; «África: imaginário, independência e desenvolvimento» Conversa temática apresentada aos estudantes de pós-graduação na 2.ª Conferência Internacional do Centro de estudos das Culturas e Línguas Africanas e da Diáspora Negra (CONCLADIN), São Paulo, Universidade Estadual de São Paulo, Araraquara – Brasil, 18 a 21 de Maio de 2009; «A imigração colonial portuguesa a Angola: um processo de construção de um projecto nacional para o porvir», comunicação apresentada no X Congresso Luso-Afro-Brasileiro de Ciências Sociais, Braga, Universidade do Minho, de 4 - 7 de Fevereiro de 2009. Publicou, «As três formas históricas de desenvolvimento rural: uma breve incursão no contexto teórico do seu surgimento», Revista Letras e Ciências Sociais, n.º 1, Janeiro-Junho de 2010, pp. 55-71.

antoniosantana2000@yahoo.es

Artigos do mesmo autor

A percepção da educação desde a perspectiva sociológica - Parte 3

 Sociologia e Educação: Karl Mannheim e suas contribuições para a ...

A sociologia da educação de K. Mannheim

44Karl Mannheim esboçou a partir de posições teóricas e políticas o esquema geral de uma sociologia da educação, de um novo sistema de ensino, de um curriculum e de uma didáctica muito actuais.

Princípios de uma política educativa democrática e eficaz

45A sociologia da educação de Mannheim não se limita estritamente à sociologia do sistema de ensino, enquadra-se na estrutura definida pelos seus pressupostos epistemológicos básicos e por sua visão pessoal dos princípios fundamentais de uma política educativa democrática e eficaz. O desenho desses princípios resume-se em: 1) educação para a mudança, garantida por uma formação básica rigorosa e comum; 2) educação para todos, o que implica a recusa decisiva do biologismo sociopedagógico e da lógica de «a barreira e o nível», própria da classe académica, a potenciação da igualdade de oportunidades e a democratização — não ao nivelamento para baixo — de todo o sistema; e 3) educação permanente em estreita relação com a realidade e a mudança social.

46Deste modo, a educação escolar, concretamente, já não pode se considerar «só como uma introdução a uma sociedade dinâmica, mas como um agente das mudanças sociais» (MANNHEIM 1974: 297). Quer dizer, deve transmitir aos jovens uma síntese da experiência tradicional e, ao mesmo tempo, pô-los também em condições de construírem por si mesmos uma nova sociedade, proporcionando-lhes, para o efeito, uma concepção do ambiente natural e do meio humano o mais científica possível, que lhes permita entender seu lugar na realidade e comprometerem-se responsavelmente na resolução dos problemas mais importantes do presente.

47A nova educação há de ser autenticamente democrática, para todos. Mas, para tal, é necessário recusar a selecção psicométrica e o biologismo ideológico em geral, tratando de proporcionar, em compensação, a toda a população as mesmas oportunidades educativas. O autor fala, pois, de «democratização, não a nivelação, da educação», isto é, «ampla participação do povo na vida cultural [...] e supressão do complexo de inferioridade que as sociedades plutocráticas e autoritárias cultivam tão cuidadosamente» (MANNHEIM 1974: 123-133).

48Para Mannheim, é por conta do controle do sistema académico-profissional tradicional e da imposição da lógica de «a barreira e o nível» que o «capital cultural» condiciona a educação social tanto como o capital económico, na medida em que «os interesses criados pelas classes educadas na limitação da educação superior são, pelo menos, tão poderosos como os interesses criados pelo capital» (ibidem: 322).

49Portanto, a educação democrática, para a mudança e para todos, deve ser também uma educação permanente e de qualidade. Posto que «se há de transformar a educação na sólida base da sociedade, deverá prever-se a continuidade de sua organização» (ibidem: 322).

Necessidade de uma educação democrática, permanente e de massas

50Para Mannheim, a «educação social» implica a rotura clara com o sistema de ensino tradicional e a necessidade de sua reforma radical. Esta passa, forçosamente, pela rotura crítica com a escola elitista e formalista tradicional, e pela necessidade de garantir a qualidade do ensino como critério guia básico da nova política educativa e, também, como prova social de uma democratização efectiva.

51Tal como Durkheim, Mannheim concebe também a escola moderna como um meio moralmente organizado e em relação coerente com todo um conjunto de instituições, produto e garantia social do «planeamento para a liberdade», com a contribuição do sistema educativo ao consenso político próprio da «democracia militante», que deve se completar com a selecção democrática dos cidadãos mais aptos para exercer as principais funções sociais directivas. Pois:

«Não é possível uma sociedade sem grupos dirigentes responsáveis, e [...] o remédio social diante a uma oligarquia não consiste em substituí-la por outra nova, mas em facilitar o acesso às posições de decisão aos mais aptos dentre as camadas inferiores» (MANNHEIM 1961: 101).

52Segundo Mannheim, o sistema escolar da sociedade vitoriana era essencialmente elitista, próprio de uma «democracia comercial» para minorias e de uma época de prosperidade económica e consenso social. Daí sua concepção escolástica e apartada da vida do estudo e da aprendizagem: o império do exame e do culto à memória, a erudição e o formalismo pedagógico. Ao contrário, o que hoje se necessita é de um sistema de ensino realmente democrático, que garanta a educação permanente e progressiva de todos os cidadãos, em estreita relação com a complexidade característica da sociedade da informação, global e de massas do nosso tempo.

53No entanto, a renovação parcial e relativamente autónoma do sistema de ensino não é suficiente; para consolidar-se, deve apoiar-se na reorganização democrática geral do conjunto da sociedade:

«No passado existia uma separação absoluta entre o lar e a escola. Hoje, em compensação, leva-se a cabo tentativas de juntar os pais e os professores e coordenar desta maneira as influências vindas da escola com as que actuam no lar» (MANNHEIM 1961: 79).

54O sistema de ensino não deve se limitar a preparar cada nova geração para sua integração na vida profissional e na sociedade em geral, mas também tem de nuclear as experiências sociais que têm como objectivo básico a educação permanente dos cidadãos. Porque, hoje, a velocidade com que as mudanças se sucedem, alimentadas pelas aspirações tecnológicas e sociais, a rapidez com que a informação se torna obsoleta, não só não permitem um aprender para a vida, como também deslocam os objectivos da educação, na medida em que a sociedade se torna pouco estável, assim como suas demandas. Por isso, a educação de jovens e adultos não deve ser concebida nem funcionar na prática como sucedâneo da universidade tradicional, mas como um mecanismo social eficaz para a actualização profissional, científica, democrática e cultural de todos os cidadãos, prestando uma atenção muito especial à difusão sistémica das visões científicas de conjunto sobre a natureza e a sociedade. Para Mannheim,

«A educação de adultos não continuará sendo uma espécie de substituto da educação universitária para os trabalhadores e empregados. Deverá dedicar-se a ajudar todos os cidadãos a adaptarem-se inteligentemente às exigências de mudança de uma sociedade nova [...] se a educação de adultos trata verdadeiramente de ajudar a criar cidadãos reflexivos, que se preocupam pelos problemas públicos em todas as actividades da vida, bem equipados para julgar os problemas correntes da democracia, terá de deixar de seguir os abalos superficiais do momento» (MANNHEIM 1974: 305-306).

55Relativamente à reforma, Mannheim tinha consciência de que o êxito de qualquer processo de reforma educativa real (e não meramente retórica) que intentasse implementar se sujeitaria à vontade do professorado em participar dela. Para ele, o novo sistema de ensino da «democracia militante» precisa de um professor capaz de renunciar a todo o tipo de dogmatismo ideológico e disposto a tudo fazer para entender estritamente a cultura actual, adoptar uma visão mais ou menos unitária e de conjunto da mesma, e passar um conhecimento especializado e uma formação integradora aos seus alunos. Mas, para isso, necessita conhecer com profundidade tanto o meio social de procedência dos alunos como a estrutura geral da sociedade em que têm de se integrar como profissionais e como cidadãos. Para tal, Mannheim propõe a inclusão, no plano curricular de formação inicial dos professores, de matérias de tronco comum, como a psicologia, a sociologia geral, a sociologia da cultura e a sociologia da educação.

«Ou, para dizer em linguagem académica, o prévio: para ajudar a formação de uma educação à altura de nossos dias são necessários os seguintes cursos: 1) Sociologia da educação; 2) Ciência da conduta; 3) Sociologia da cultura; 4) Análise da estrutura social» (MANNHEIM 1961: 86).

56Defensor da síntese da espontaneidade criativa e da disciplina inteligente como chave principal da nova pedagogia da «democracia militante», do «planeamento da liberdade» e do seu novo sistema de ensino, Mannheim critica ostensivamente a pedagogia autoritária, com o seu ideal da obediência cega, e as pedagogias liberal e libertária, por sua teoria da existência de uma natureza humana eterna e histórica e sua concepção da prática educativa em função da suposta espontaneidade total de cada indivíduo humano.

«Se a velha educação autoritária era cega às necessidades vitais e psicológicas da criança, o liberalismo do laissez faire perturbou o equilíbrio saudável entre o indivíduo e a sociedade…» (MANNHEIM 1961: 49).

«A teoria da educação liberal insistia em que os valores básicos e os objectivos da educação tinham carácter eterno e que o propósito final e exclusivo da educação consistia em fomentar o livre desenvolvimento da personalidade mediante a manifestação sem impedimento de suas qualidades inatas» (MANNHEIM 1961: 81).

57À semelhança de outros autores do seu tempo, como Gramsci, Mannheim é de opinião que o naturalismo rousseauniano deve situar-se no seu contexto sócio-histórico determinado, como produto lógico da reacção espontânea face ao domínio secular da pedagogia autoritária, embora tenha sido, na origem, uma atitude pedagógica progressiva. Em contrapartida, o caso dos movimentos de renovação pedagógica de inspiração rousseauniana (liberais ou libertários) é bem diferente. Além disso, denuncia os perigos da inculcação sistemática, da repressão autoritária e da obediência cega, que este tipo de tendências pedagógicas tenta passar a todo o custo através do seu cântico melódico dos valores da espontaneidade, da capacidade criativa e da experiência livre.

58A existência histórico-social destas tendências pedagógicas ultra-críticas é possível, precisamente, porque se trata de orientações teóricas que têm influências directas na educação social. Se ainda persistem é porque as minorias intelectuais que as alimentam se encontram relativamente protegidas das exigências mais comuns da existência social, enquanto se servem dessas posições ideológicas para cimentar seu individualismo imoderado, produzir sua identidade social e reproduzir sua situação relativamente privilegiada.

59A prática educativa sempre modela o tipo humano mais incoerente com a estrutura social. Não se trata de nenhuma obrigação de ter de optar entre a pedagogia extrema da obediência cega e a liberdade utópica. Trata-se, sim, de organizar a educação de modo que se logre a melhor combinação possível entre a espontaneidade criativa e a disciplina inteligente: a personalidade democrática. Quer dizer, há que educar, acima de tudo, para a solidariedade afectiva e a coesão social; e, enquanto isso, há que fomentar a liberdade de julgamento, o equilíbrio psíquico pessoal e, em geral, as qualidades que distinguem a personalidade independente. Naturalmente, o primeiro princípio deverá caracterizar os primeiros níveis básicos da educação, e o segundo, progressivamente, os níveis médio e superior.

60A democratização do ensino representa a possibilidade de uma autêntica revolução cultural, mas pode desaproveitar-se se não for cuidadosamente planeada. Não basta o desenvolvimento extensivo do sistema educativo moderno. O critério guia da sua democratização constitui a qualidade do ensino. E esta consiste em elevar sistematicamente o pensamento inferior ao nível superior, e não em nivelação para baixo. A reforma progressista do sistema de ensino deve garantir a qualidade, fomentar a progressividade e impedir a degradação do ensino. Porém, uma reforma demasiado rápida do sistema de ensino tradicional pode converter-se em uma fraude social (uma transformação social formal, aparente), que pode comprometer a cultura de uma sociedade determinada em geral.

Curriculum oculto e curriculum manifesto

61Apesar de hoje se falar pouco da necessidade de distinção entre aquilo que se ensina (os conteúdos sobre os quais repousa a instrução escolar) e a forma como se ensina (o modo como se passa os conhecimentos inerentes aos conteúdos), é algo bastante importante e, naturalmente, complexo. Na opinião de Mannheim,

«Tudo o que ensinámos e, mais ainda, a forma como ensinámos, tem um efeito determinado na formação do carácter [...] Sabemos hoje que o tipo de jogo que se proporciona e os detalhes íntimos da organização da escola são muito mais importantes do que os títulos que outorgamos a esses sistemas escolares. A organização social da escola, o tipo de "papéis" sociais em que se possa participar, o predomínio da competência ou da cooperação, e a existência de uma oportunidade maior para o trabalho em equipa do que para a tarefa solitária, todos são coisas que contribuem para o tipo de homem que há de formar-se em semelhantes situações» (MANNHEIM 1961: 81).

62Por um lado, o curriculum deve considerar os efeitos educativos do modelo de escola: hierárquico ou democrático; para a competição individualista ou para a cooperação. Deve também impedir que a escola funcione como um mecanismo de reprodução das desigualdades sociais, tirando partido do sistema de internato e das melhores lições da experiência histórica em geral, e das vantagens educativas do grupo de iguais. Por outro, é importante a forma de estruturação do que hoje chamamos curriculum manifesto. Uma estruturação excessivamente fragmentada e especializada priva o aluno da possibilidade de alcançar em algum momento uma visão suficientemente unitária e crítica do seu próprio meio. Porém, com uma estruturação coerente, unitária e integral, ocorre precisamente o contrário.

63Além disso, a formação plena da pessoa não se pode acautelar em absoluto com recurso a uma determinada disciplina curricular, mas que depende do funcionamento geral do curriculum escolar — oculto ou manifesto – e do conjunto da sociedade — da sua influência sobre os diversos grupos de indivíduos.

64Mannheim sublinha a eficácia pedagógica das «ideias directrizes» durkheimianas, quer dizer: dos conteúdos gerais essenciais e potencialmente mais unificadores. Fá-lo no contexto da denúncia da frequente confusão da tolerância e da objectividade com a neutralidade, por mais intensa que seja a obsessão política pelo consenso social. Segundo o autor,

«Nem a tolerância democrática, nem a objectividade científica exigem que deixemos de defender as posições tidas por verdadeiras, nem que se evite toda a discussão sobre os objectivos e valores finais da vida» (MANNHEIM 1961: 95).

CONVITE AO DEBATE