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quarta-feira, junho 15, 2016

A dimensão geopolítica do golpe de estado em curso no Brasil

    Por Waldeck Carneiro

Os riscos de se analisar, de forma superficial ou incompleta, o golpe de estado que as forças conservadoras e reacionárias tentam perpetrar no Brasil, nos dias de hoje, não são pequenos. Afinal, pode-se invocar, como razão desta tentativa de golpe, o ressentimento dos partidos derrotados nas eleições presidenciais de 2014, que, inconformados com a quarta derrota consecutiva, decidiram não reconhecer o resultado e enveredaram por um terceiro turno, desde o início do segundo mandato de Dilma Roussef. Essa análise procede, mas não explica tudo.
Também é possível atribuir a tentativa de golpe de Estado à vingança engendrada pelo atual Presidente da Câmara dos Deputados, quando se confirmou que os três deputados petistas no Conselho de Ética daquela Casa não apoiariam suas manobras para se livrar da cassação, que, de forma estarrecedora, ainda não ocorreu. Aliás, a Câmara Federal já votou a admissibilidade do processo de impedimento de uma presidenta sobre quem não pesa nenhuma acusação de corrupção, mas segue blindado, contra o protesto de uma minoria de deputados, o Sr. Eduardo Cunha, que é réu em vários processos que se arrastam no Supremo Tribunal Federal, por crimes de corrupção, lavagem de dinheiro, entre outros. Essa análise igualmente procede, mas também não explica tudo.
É fundamental trazer para o centro da análise as razões mais profundas do golpe ora em curso para entender o que ocorre hoje no Brasil. Tais razões têm a ver com os interesses do grande capital transnacional, tal como ocorreu no contexto do golpe civil-militar desfechado em 1º de abril de 1964. Por um lado, com os interesses contrariados do grande capital, face à insistência de vários países da América Latina em praticar, nos últimos doze anos, políticas igualitaristas, que alargam direitos, promovem cidadania e incluem socialmente os mais pobres. Esse “mau exemplo” dado por países como Argentina (na era Kirchner), Uruguai (governo Mujica), Venezuela, Equador, Bolívia e Brasil precisava sofrer uma interrupção. Prova disso é o documento “Uma ponte para o futuro” – já popularizado como Uma pinguela para o passado -, que resume as propostas de Temer para o Brasil, pautado por uma clara perspectiva de desconstrução de direitos dos trabalhadores. Outro interesse contrariado: os BRICS se atreveram a avançar na ideia da construção de um banco internacional independente, confrontando os “sacrossantos” FMI e Banco Mundial, líderes da agiotagem internacional e credores vorazes de grande parte do globo.
Por outro lado, cabe ressaltar os interesses que o capital transnacional deseja impor: o controle, pelas petrolíferas internacionais, das grandes reservas de petróleo na camada do pré-sal, patrimônio inalienável do povo brasileiro. Não é coincidência que um dos principais representantes daqueles interesses no Brasil, o Senador tucano José Serra, tenha apresentado no Senado um Projeto que desmonta o regime de partilha, de modo que a gestão das reservas de petróleo no Brasil saia da órbita do Estado Brasileiro e fique sob controle privado internacional. Afinal, a queda vertiginosa e surpreendente do preço do petróleo no mercado internacional de commodities, que afetou drasticamente a economia brasileira e, em especial, do estado do Rio de Janeiro, não é apenas um fenômeno meramente econômico, mas antes tem fortes dimensões geopolíticas.
Portanto, sem considerar os interesses do grande capital internacional e dos Estados que o representam, situados no centro do capitalismo mundial, não será possível compreender esta tentativa de golpe contra a ainda frágil experiência democrática brasileira. Não terá sido a primeira vez que o capital, no intuito de fazer com que prevaleça sua lógica, atenta contra a Democracia, a Constituição e a Soberania Popular de um país, como faz agora na República Federativa do Brasil.

Waldeck Carneiro, deputado estadual (PT-RJ), é professor da Faculdade de Educação e do Programa de Pós-Graduação em Educação da UFF, PhD pela Universidade de Sorbonne.

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