Na Escolha Pública existe um fenômeno conhecido como “captura regulatória”. Ocorre quando os agentes no mercado usam sua influência para fazer com que os reguladores aprovem regulações que tem como objetivo final impedir o surgimento e/ou fortalecimento dos seus concorrentes. No geral, as novas leis e burocracias vem embaladas em justificativas “técnicas” ou anti-monopolísticas. Os sistemas de telefonia e o transporte coletivo em praticamente todas as cidades do Brasil são exemplos claros desse acontecimento.
No sistema político-partidário não é diferente. As regulamentações existentes e as propostas de reformas sempre parecem guiadas pelo ímpeto de fazer o possível para impedir que candidatos de fora do status quo possam vencer as eleições.
Chutando você para fora
Como toda e qualquer regulamentação, as vigentes no sistema eleitoral foram criadas com a desculpa de garantir uma concorrência mais isonômica entre os candidatos. A lei contra propaganda eleitoral antecipada, o fundo partidário, o programa eleitoral gratuito, a vedação da distribuição de brindes e camisas, etc. todas são fundadas no princípio que diminuir a influência do “poder econômico” nas eleições é essencial para o bom funcionamento da democracia. Que nenhuma delas funcione e tenha o efeito oposto ao esperado parece não afetar tanto assim o sistema democrático.
Proibir a propaganda eleitoral fora do período das eleições apenas impede que candidatos pequenos e sem muito dinheiro possam usar os meses anteriores ao pleito para divulgar suas propostas e ampliar o debate ideológico nas eleições. Multas de alguns milhares de reais são ínfimas para campanhas milionários como as levadas a cabo pelo Partido dos Trabalhadores, mas custam muito para quem está custeando sua candidatura com o dinheiro que deveria estar indo para os seus filhos. O efeito da final lei é: grandes partidos sentem-se à vontade para desrespeitar a legislação e pequenos candidatos não fazem campanha com medo da interpretação do juiz eleitoral sobre o que se configurará como propaganda antecipada.
A proibição da distribuição de brindes, camisas, realização de showmícios, etc. não diminuíram o custo das campanhas como era esperado. Pelo contrário! Se eleger só vem se tornando mais e mais caro. Os recursos não deixaram de ser gastos, apenas foram realocados para agências de publicidade, jornalistas e militantes na internet. Bom para candidatos que podem montar superestruturas, péssimo para quem quer começar sua vida na política.
Além de todas essas barreiras, um iniciante no mundo dos partidos tem que enfrentar alguns privilégios já estabelecidos em nome da isonomia. A maior parte das cotas do fundo do partidário (95%) e do tempo de propaganda da televisão (2/3) são divididos de acordo com a bancada atual de cada partido no Congresso. Se você está fundando um novo partido, ou concorrerá por uma agremiação menor porque a porta das maiores sempre está fechada, terá que lidar com o fato de que nos seis primeiros meses do ano, apenas PT, PMDB e PSDB receberam juntos R$ 60 milhões do contribuinte brasileiro. E para piorar a situação, o tempo de televisão pode ser somado, isto é, quanto mais partidos apoiando o candidato X, mais tempo ele terá. Não é muito difícil perceber a razão leva o candidato governista sempre ocupar o maior espaço do guia.
O intervencionismo, e isso inclui as intervenções no sistema eleitoral, tem uma dinâmica própria. As intervenções passadas não deram certo? Basta intervir um pouco mais que as coisas vão começar a funcionar.
Com esse ímpeto, alguns defendem a volta da verticalização partidária como forma de impedir o joguete político em busca do tempo de televisão, isto é, os partidos fariam alianças a nível nacional que obrigatoriamente teriam que ser cumpridas a nível local. Um ótimo meio de fazer com que a coerência volte ao cenário político? Infelizmente não. O único resultado real da proposta é concentrar ainda mais poder na mãos dos grandes caciques que irão cobrar ainda mais pelo seu apoio que garantirá um partido inteiro. Dissidentes e a influência que novas lideranças possam ter nas eleições.
Outros acreditam que se as campanhas fossem financiadas apenas com dinheiro estatal todos os problemas atuais acabariam. A corrupção deixaria de existir porque todo mundo sabe que corporação não faz doação, e sim investimento. Os partidos estariam livres das amarradas do poder financeiro, poderiam competir em condições de igualdade, e unicórnios andariam na Terra montados por elfos tocadores de harpas. Não é para tanto. O financiamento privado de campanha sempre existirá, a grande diferença é que agora ele estará na ilegalidade, beneficiando as velhas raposas políticas que tem um largo know-how fazendo caixa dois. Não só isso, como doações espontâneas seriam banidas do mercado e apenas aqueles que realmente tivessem planos de corrupção se sentiriam à vontade para burlar a lei. E esses parecem ser os menores dos problemas da ideia.
O financiamento compulsório do sistema eleitoral via estado esbarra na fórmula de como devemos distribuir o dinheiro entre os postulantes. Se adotarmos o mesmo método do fundo partidário, como poderemos promover mudanças se em toda eleição o partido do governo já começa na frente e a sociedade é proibida de equilibrar o jogo? Talvez adotando um sistema em que todos os partidos recebam a mesma quantia a situação fique mais equilibrada, mas como evitar o surgimento de outra figura analisada pela Escolha Pública: o rent-seeker? Como evitar que apareçam aqueles que vivem única e exclusivamente dos seus partidos? Algo que já ocorre hoje em dia graças ao fundo partidário.
Uma solução mais absurda ainda foi a proposta de dificultar ainda mais a criação de novos partidos para impedir a criação de legendas de aluguel. Hoje em dia já é bastante difícil criar uma nova agremiação. O Partido Novo levou cerca de quatro anos e muito trabalho para poder cumprir toda a burocracia necessária. Quer dizer, é difícil se você não for político. Quando Gilberto Kassab quis fazer um partido, levou menos de seis meses.
Mais intervenção e mais burocracia, como em qualquer outro setor, só vão beneficiar quem entende e tem conexões dentro dos meandros do estado. Se nós queremos eleições que representem o que a população pensa e isonômicas temos que retirar todos os privilégios que os grandes partidos já têm e fazer com que o financiamento da campanha seja completamente voluntário e jamais erguido com dinheiro que o pagador de impostos é obrigado a dar. Mas sobretudo, nós temos que fazer com que os políticos não tenham favores para vender, assim nenhuma corporação vai poder comprá-los.
Nenhum comentário:
Postar um comentário