PSTU E ALIADOS COMETEM O ERRO DO PC ALEMÃO
Em meio à crise política que assola o país, a maioria das organizações de esquerda não está passando à prova. Luciana Genro vem sendo alvo de represálias de seu próprio partido por ter assumido uma posição de saída de Dilma, mediante TSE, junto com Marina Silva, se caracterizando cada vez mais como a porta-voz da “esquerda Lava Jato”.Sua corrente, o MES, não contente com isso, ainda soltou um longo artigo no qual reivindica a OAB e figuras como Miguel Reale Júnior. Impressionante!
Já o PSTU tem emergido como outro grande exemplo de uma política desastrosa para a situação atual. Em meio à ameaça cada vez mais crescente de um golpe institucional, arquitetado via manobras do Judiciário e tendo à frente Sergio Moro, aliado do PSDB e defensor aberto de interesses imperialistas, e que significará um endurecimento autoritário do regime político contra o povo e os trabalhadores, o PSTU coloca como política fundamental o “Fora Todos e Eleições Gerais”. Isto é, sua política termina sendo funcional tanto para as alas da direita que defendem o impeachment, quanto para as que defendem a cassação da chapa Dilma-Temer, via TSE, e antecipação das eleições.
Assim, tal como o PC alemão, cuja crítica de Trotsky desenvolveremos aqui, pode-se dizer do PSTU que “está tudo errado: a avaliação da situação é incorreta, o objetivo imediato está incorretamente colocado, os meios para alcançá-lo foram equivocadamente escolhidos” [1]. Por isso, faz-se necessário encarar a discussão do ponto de vista teórico também. Para avançar neste terreno, retomaremos alguns dos debates que Trotsky fez com o Partido Comunista alemão em 1931, no texto“Contra o comunismo nacional! (Lições do referendo vermelho!)” , pois parecem ser pouco conhecidos pela esquerda.
Uma analogia histórica útil
Em 1931, apenas dois anos antes da ascensão do nazismo na Alemanha, mais especificamente em 21 de julho, o Partido Comunista alemão lançou exigências de concessões democráticas e sociais ao governo prussiano, chefiado então pela socialdemocracia. Nas palavras de Trotsky, essa movimentação da burocracia stalinista na Alemanha era em verdade uma “proposta de frente-única ao mais alto estrato da socialdemocracia, sob certas condições com a socialdemocracia contra o fascismo”. O governo da socialdemocracia encontrava-se naquele momento submetido a um plebiscito que havia sido defendido pelos nazistas, como forma de enfraquecer seu poder.
Quando a socialdemocracia nega-se a atender às condições exigidas pelo PC para a conformação da frente-única contra os nazistas, a burocracia stalinista forma, segundo Trotsky, “uma frente-única com os fascistas contra a socialdemocracia”. Essa frente-única entre PC e nazis se materializou num chamado do PC pela realização de um “plebiscito vermelho” contra o governo da socialdemocracia. Uma apropriação com verborragia vermelha da política dos nazistas que levou o Partido Comunista a votar junto àqueles pela queda do governo da socialdemocracia na Prússia. Uma política absurda, que colocou os nazistas e o Partido Comunista lado a lado, e que foi duramente criticada por Trotsky.
É evidente que toda analogia histórica deve ser tratada como tal, uma analogia. Há que se considerar as diferenças das situações concretas, que não são menores. Hoje não está colocada a questão do fascismo em nenhum nível. Essa verborragia utilizada pelo petismo serve apenas à busca pela criação de base para sua política de defender o governo do PT acriticamente. Somos marxistas e, para nós, a distinção de graus de direitismo da situação e dos setores que atuam não é um detalhe. O que existe é uma direita ajustadora que busca na atualidade facilitar a ascensão de um governo que acelerará o ritmo dos ataques, e isso não apenas através do seu programa, mas também pelas forças sociais que impulsiona. Essas forças abarcam tanto a burguesia imperialista, como a classe média alta, assim como tem se dado em vários países da América Latina, tal como discutimos aqui.
Evidente que não se trata de salvar o governo do PT, como mal menor, mas barrar o avanço desses setores. Por isso, a despeito das distinções da situação, que não ignoramos de nenhuma maneira, as críticas que Trotsky faz ao PC naquele momento são extremamente úteis para ver como a política de “Fora Todos” e “Eleições Gerais” reproduz os fundamentos da lógica do PC alemão em 1931.
Um exemplo do que não se deve fazer
Trotsky critica aquela política do PC alemão dizendo que “os erros do Partido Comunista alemão sobre a questão do plebiscito figuram entre os que se voltarão mais claramente, na medida em que o tempo passe, e terminarão por entrar para os livros de texto da estratégia revolucionária como exemplo do que não se deve fazer”. Da mesma maneira podemos avaliar a política do PSTU hoje, que será lembrado como um partido que foi a ala esquerda do impeachment, e do consequente fortalecimento das medidas autoritárias do regime, e da aceleração dos ajustes contra os trabalhadores.
Isso porque a lógica da adaptação do PSTU à direita, a Moro, ao Judiciário, TSE, etc., com sua política de “Fora Todos” e “Eleições Gerais”, como se fosse possível na situação concreta uma versão de “impeachment dos trabalhadores”, sem que a classe trabalhadora esteja atuando como sujeito independente nesse sentido, é bastante similar à adaptação do PC alemão e seu plebiscito vermelho à política defendida pelos nazistas em 1931.
Vejamos o que diz Trotsky: “É certo, no entanto, que Thaelmann [2] formou uma frente-única com Hitler? A burocracia comunista chamou de “vermelho” o referendo de Thaelmann, em contraste com o plebiscito de Hitler. Que o assunto concerne a dois partidos mortalmente hostis está naturalmente fora de dúvida, e todas as falsidades da socialdemocraca não levarão os trabalhadores a se esquecerem disso. Mas há um fato que permanece igual: nessa campanha a burocracia stalinista conduziu os trabalhadores revolucionários em uma frente-única com os nacional-socialistas contra a socialdemocracia”.
Da mesma forma que o PC alemão, o PSTU acha que é possível atuar como ala esquerda de uma mesma posição que é defendida pela direita, sem prestar um serviço a ela. Colocando o chamado ao “Fora Todos” e por “Eleições Gerais” como bandeiras do ato do dia 1 de abril convocado pela Conlutas, o PSTU não vê que lança os trabalhadores numa frente-única com a direita contra o governo do PT. Uma política que só poderá levar ao fortalecimento da direita, e não à formação de uma alternativa independente para lutar contra o governo do PT e seus ajustes, tendo como sujeito a classe trabalhadora com seus métodos.
O exemplo do que deve ser feito no dia 1 e em todos os atos enquanto não houver uma mudança substancial da situação, vem justamente da votação ocorrida na assembleia de base dos trabalhadores da USP em 31 de março. Nessa assembleia, a posição de impulsionar um movimento contra o impeachment e contra os ajustes do governo do PT foi votada, portanto será a bandeira levada pelos trabalhadores desse setor no dia 1 de abril. Algo absolutamente oposto ao que faz o PSTU como maioria da Conlutas, que quer colocar sua base detrás do “Fora Todos” e “Eleições Gerais”, porque acredita que “o governo que substituir Dilma será mais débil”. Como a ascensão da direita ao poder pode favorecer aos trabalhadores?
Ao não atuar conforme o indicado pelos trabalhadores da USP em sua assembleia, o PSTU se adapta não apenas à direita, mas também à burocracia sindical da CUT, que segue tendo mãos livres para agir apenas em defesa do governo, e não para preparar nenhuma luta contra os ajustes do PT. A ampla massa dos trabalhadores não foi aos atos da direita. Segue na base da CUT. Aprovar numa assembleia de base, como ocorreu no SINTUSP, impulsionar um movimento que se dirija às centrais sindicais para colocar de pé um movimento de trabalhadores contra o impeachment e contra os ajustes é uma plataforma em pequeno, da orientação de Trotsky quando afirma que “a política de frente-única se deveria entender ao menos uma ação comum, não com os trabalhadores que deixaram a socialdemocracia, mas com aqueles que permanecem em suas fileiras. Por desgraça, há ainda um grande número deles”.
Ligado a isso emerge a questão da correlação de forças, posto que não existe hoje nenhuma mobilização independente e de massas da classe trabalhadora para tirar o governo do PT pela esquerda. Como dizia Trotsky: “problema, consequentemente se reduz à correlação de forças. Sair às ruas com a consigna ‘Abaixo o governo de Brüning e Braun!, em um momento que a correlação de forças somente pode ser substituída por um governo de Hitler é o mais puro aventureirismo. A mesma consigna, porém, adquire um significado totalmente diferente se converte-se em uma introdução à luta direta do proletariado pelo poder”. Isso é importante, pois se há mudanças nas condições objetivas e subjetivas, a política dos revolucionários também deve mudar. No entanto, hoje essa correlação de forças marcada pela entrada em cena do proletariado lutando pelo poder é inexistente. Daí a importância de lutar para que ela entre em cena, com uma frente-única a partir dos sindicatos, que hoje devem encarar como primeira tarefa o combate à direita e sua política de impeachment e manobras do Judiciário, levando-a a derrotar os ajustes do governo do PT.
O PT ataca, certo. Mas, por que o PSTU quer encurtar o caminho para a direita?
Dessa forma, o questionamento que Trotsky faz frente aos motivos que levaram o PC alemão a votar com o nazismo contra a socialdemocracia se aplicam também para pensar a política do PSTU. “Que propósito político a direção do Partido Comunista buscava com esse giro? Quanto mais se leem os documentos oficiais e os discursos dos dirigentes menos se entende esse propósito. O governo prussiano, nos diz, que está abrindo caminho contra o fascismo. Isso é absolutamente correto. (...) Até esse ponto, estamos totalmente de acordo. Mas que conclusão política se desprende disso? Não existe o menor fundamento para apoiar o governo, para aceitar sequer uma sombra de responsabilidade pelo mesmo ante as massas, nem sequer debilitar em nada nossa luta contra o governo de Brüning [3] e sua agência prussiana. Todavia existem menos razões para ajudar aos fascistas a substituir o governo (...). Porque se acusamos com bastante justiça aos socialdemocratas de preparar o caminho ao fascismo, menos ainda pode consistir nossa tarefa política em tornar esse caminho mais curto”.
De maneira análoga, podemos trazer esse questionamento para hoje. O PSTU tenta justificar sua posição de “Fora Todos” dizendo que o “PT ataca e está descarregando ajustes sobre as costas da classe trabalhadora”. Correto. Mas isso não justifica a absurdidade de sua política. Pelo contrário. Aqui se pode literalmente parafrasear a passagem acima, e partir de que se também não existe o menor fundamento para apoiar o governo do PT, nem aceitar “uma sombra de responsabilidade sobre ele”, tal como diz Trotsky sobre o governo da socialdemocracia na Prússia. Mas também aqui existem menos razões ainda para ajudar a direita, o Judiciário e Moro, como também substituir o governo do PT com o impeachment. Porque se acusamos o PT de atacar os trabalhadores, “o último em que pode consistir nossa tarefa política é tornar mais curto o caminho da direita ao poder”.
Por tudo isso, e a despeito das distinções da situação em relação a 1931, lançar a política de “Fora Todos” em um momento em que a correlação de forças está marcada por atos dirigidos pela direita, em base à classe média alta das grandes cidades, que reivindica abertamente Moro e a Polícia Federal, e a classe trabalhadora não está posta em cena com seus métodos, é também completamente aventureiro. A tarefa agora consiste no oposto do que faz o PSTU. Passa por ter uma política que defenda claramente a necessidade de colocar em cena a classe trabalhadora, não detrás da direita, mas sim como sujeito independente, com seus métodos históricos de luta, acionada através de uma frente-única que se coloque contra o impeachment e os ajustes do governo do PT. Que imponha pela força da mobilização uma Assembleia Constituinte Livre e Soberana, no caminho de um governo dos trabalhadores e do povo.
Fonte: Esquerda Diário
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